Os lábios naturais e volumosos da loura adolescente Coralie (16s) são irresistíveis. Com uma pele branca perfeita e sedosa, as faces rosadas, a vitalidade fresca da juventude – ela é uma tentação. Considerada a menina mais bonita de sua pequena cidade, bicampeã do concurso de miss da região, ela tem certeza que o estrelato lhe espera. Sua mãe, uma mulher vaidosa e fútil, vê nela a salvação da família e sonha em desfrutar do orgulho da filha e da vida de glamour de mãe de celebridade. A forma como ela se veste – com sensualidade ostensiva, atrai olhares de cobiça e/ou inveja. Entretanto, quando ela abre a boca seu sotaque caipira e a linguagem recheada de gírias e palavrões quebram um pouco do encanto. Atrás da pretensa segurança, ela tenta esconder a ingenuidade e imaturidade para lidar com as situações com que se defronta na metrópole. O observador Balzac logo capta o lado desprotegido e se sensibiliza afetuosamente com essa “Lolita”.
NA COMÉDIA HUMANA
Em A Comédia Humana, Coralie aparece apenas em Ilusões Perdidas (T03 de Balzaquianas junto com Esplendores e Misérias das Cortesãs). Mas sua memória é evocada em outros romances. Coralie é vendida, aos 15 anos, por sua mãe à Henri de Marsay e se torna uma das mais célebres prostitutas da obra de Balzac. Ela é uma das “lorettes” de A Comédia Humana, categoria a qual Balzac devotava um carinho especial, um intermediário entre as ricas cortesãs e as prostitutas de rua, elas são as “mulheres que o mundo precisa”. De uma beleza sublime, ela é capaz de total abnegação quando apaixonada e morre na miséria após seu fracasso numa peça de teatro escrita por Félicité sob o pseudônimo de Camille Maupin. Coralie é então substituída por sua “rival” Florine.
“Coralie exibia um sublime semblante judaico, aquele longo rosto oval de um tom de marfim alourado, boca vermelha como uma romã, queixo fino como a beira de uma taça. Sob as pálpebras quentes e como que queimadas por pupilas de azeviche, sob os cílios recurvos, pressentia-se um olhar lânguido em que cintilavam bem a propósito os ardores do deserto. Esses olhos eram assombreados por um círculo esverdeado, tendo ao alto sobrancelhas arqueadas e espessas. Sobre uma fronte morena, coroada por dois bandós de ébano em que brilhavam então as luzes como sobre verniz, reinava uma magnificência de pensamento que poderia fazer crer num gênio. Mas Coralie, parecida com muitas atrizes, não tinha inteligência, apesar de sua ironia nos bastidores, não tinha instrução, apesar de sua experiência de boudoir, tinha apenas a inteligência dos sentidos e a bondade das mulheres apaixonadas.”