Balzaquianas

Honoré de Balzac

Com vinte e poucos anos e uma compleição parruda, Balzac é um otimista incorrigível apesar de sua vida carente. 

Privilegiado com uma memória fotográfica gigantesca, ele é ávido por conhecimento e mergulha fundo nos assuntos que o interessam. 

A velocidade com que lê e pesquisa informações na web é espantosa.  Seus inúmeros interesses incluem até decoração de interiores e esse ecletismo não contribui para encaixá-lo em nenhuma das “tribos” atuais.  Balzac não é um, é mil.

Guloso e fora dos padrões de beleza, ele se sente mais à vontade com pessoas mais velhas do que com gente de sua idade. Balzac tem interesse verdadeiro pelos outros.  Esse “antropólogo” ingênuo se emociona quando escuta histórias pessoais sobre as quais reflete, analisa e filosofa. Ele busca ir além das aparências pois as pessoas são a matéria prima para sua arte e profissão.  

O universo feminino desafia sua inteligência e ele se empenha para decifrá-lo como aprendiz dedicado. 

Sua atração pela diversidade é enorme mas são as mulheres que mais  despertam sua curiosidade. Com o coração transbordando de paixão represada, ele procura conquistar um amor verdadeiro e,  com a libido à flor da pele, ele é assaltado por sonhos eróticos mirabolantes. 

Um vanguardista visionário cheio de contradições.  

Ao mesmo tempo que condena o poder do dinheiro e a valorização da pessoa em função de sua riqueza, ele é obcecado por fazer fortuna e ter sucesso. Focado nesse objetivo, vive germinando novas ideias: um business lucrativo, uma startup ou uma série de TV que o eternizará para o mundo.  

Na vida acadêmica Balzac é retraído.  Entretanto, quando se inflama na defesa de uma posição, ele dispara sua metralhadora de informações com empolgação cômica e exagerada. Com a família e pessoas íntimas, ele é extrovertido, às vezes sem noção, que conta bravatas e que diverte (ou ofende) com suas imitações de personagens conhecidos ou dos próprios familiares.

A mãe de Balzac, Charlotte, tem um temperamento frio e o temporão Henri é claramente seu preferido. Mas seu primogênito é um homenzarrão carente e estabanado que gosta de contato físico.  Sem percepção real de seu tamanho e força, ele se acha fofinho e delicado como uma menina.

Essa figura comum é um anti-herói cujo super poder é acreditar que tudo vai dar certo se ele trabalhar obsessivamente empregando sua energia e criatividade.

Ao longo da temporada, esse fanfarrão apaixonado e autoconfiante vai tomando diversos rumos na vida, vendo seus sonhos ruírem e aproveitando suas experiências como inspiração.  Ele é resiliente e tem fé que o reconhecimento chegará a qualquer momento.


 

NA VIDA REAL

Na vida real, Honoré de Balzac foi um escritor francês do século XIX (1799-1850) que deixou uma das obras mais importantes da literatura francesa, A Comédia Humana, Balzac foi um mestre em diversos gêneros mas sua excelência foi no realismo onde sua criatividade transcendeu e criou todo um universo ficcional paralelo ao mundo real.

O objetivo de Balzac era explorar as diferentes classes sociais e os indivíduos que a compõem para escrever o que disse ser “a história esquecida por muitos historiadores”. Um autor apaixonado por personagens e seus destinos, ele criou criaturas complexas e poderosas onde mesmo as figuras mais insignificantes têm personalidade e camadas.

Antecipando as atuais TV Series, Balzac criou a ideia de uma série de histórias e romances serializados de forma cruzada, interligados como um amplo panorama histórico de vidas e eventos.

As características de personalidade do Balzac de Balzaquianas são baseadas em dados reais levantados em diversas biografias do escritor.

Balzac por Alphonse de Lamartine (1790-1869) em “Balzac et ses oeuvres”:

“Quando cheguei muito tarde, (…) esqueci-me de tudo, de mim mesmo para contemplar Balzac. Ele não tinha nada de um homem deste século. Poderíamos ter acreditado ao vê-lo que havíamos mudado de época e que estávamos introduzidos na sociedade de um desses dois ou três homens, naturalmente imortais, dos quais Luís XIV era o centro (…)

Balzac estava de pé em frente à lareira de mármore desse querido salão, onde eu vira passar e posar tantos homens e mulheres extraordinários. Ele não era alto, embora o brilho de seu rosto e a mobilidade de sua estatura impedissem perceber seu tamanho; mas esse tamanho flutuava como seu pensamento; entre o chão e ele parecia haver alguma margem; às vezes ele se inclinava no chão como se quisesse colher um monte de idéias, às vezes ficava na ponta dos pés para seguir o vôo de seu pensamento até o infinito.

Ele não se interrompeu por mais de um minuto para mim; ele estava levado por sua conversa com Monsieur e Madame de Girardin. Ele me lançou um olhar vivo, apressado, gracioso, de uma bondade extrema. Eu me aproximei para apertar sua mão, vi que nos compreendíamos sem frase, e tudo foi dito entre nós; ele estava empolgado, ele não tinha tempo para parar. Sentei-me e ele continuou seu monólogo como se minha presença o tivesse reanimado ao invés de interrompê-lo. A atenção que eu prestava à sua palavra me deu tempo para observar sua pessoa em sua eterna ondulação. Ele era gordo, espesso, quadrado na base e nos ombros; o pescoço, o peito, o corpo, as coxas, os membros poderosos; grande parte da amplitude de Mirabeau, mas sem peso; ele tinha tanta alma que ela carregava tudo isso com leveza, alegremente, como um envelope flexível e de modo algum como um fardo; esse peso parecia lhe dar força e não retirá-la. Seus braços curtos gesticulavam com facilidade, ele falava como um orador fala. Sua voz era retumbante da energia um pouco selvagem de seus pulmões, mas ela não tinha grosseria, nem ironia, nem raiva; suas pernas, nas quais ele se balançava um pouco, carregavam seu torso com agilidade; suas mãos gordas e largas, expressavam ao se agitar todo o seu pensamento. Tal era o homem em seu corpo robusto. Mas diante do seu rosto não pensávamos mais no corpo dele. Essa figura falante, da qual não conseguíamos tirar os olhos, encantava e fascinava totalmente. Os cabelos flutuavam sobre a fronte em grandes cachos, os olhos negros perfuravam como dardos enfraquecidos pela benevolência; eles entravam com confiança dentro dos nossos como amigos; as bochechas eram plenas, rosadas, com uma tez fortemente colorida; o nariz bem modelado, embora um pouco longo; os lábios esculpidos com graça, mas amplos, erguidos pelos cantos; dentes irregulares, lascados, enegrecidos pela fumaça do charuto; a cabeça freqüentemente pendia de lado no pescoço e se levantava com orgulho heróico, animando-se no discurso. Mas o traço dominante do rosto, até mais do que a sua inteligência, era a bondade comunicativa. Ele encantava o espírito quando falava, mesmo quando se calava ele encantava o coração. Nenhuma paixão de ódio ou inveja poderia ser expressa por essa fisionomia: era-lhe impossível não ser bom.

Mas não era uma bondade de indiferença ou descuido, (…) era uma bondade amorosa, encantadora e inteligente de si mesma e dos outros, que inspirava diante dele o reconhecimento e a efusão do coração, e que desafiava não amá-lo. Tal era exatamente Balzac. Eu já o amava quando nós nos sentamos para jantar. Pareceu-me que o conhecia desde a minha infância: (…) Uma infantilidade alegre, esse era o caráter dessa figura; uma alma em férias, quando ele deixava a pluma para se esquecer com seus amigos; era impossível não ser feliz com ele. Sua serenidade infantil via o mundo de tão alto que não lhe parecia mais do que uma brincadeira, uma bolha de sabão causada pela fantasia de uma criança.

(…) Todo mundo acabou sendo da mesma opinião que ele: a consciência de um escritor de gênio intimida os tolos, destrói os malvados, tranquiliza os covardes; é isso o que Balzac revelou aos meus olhos. Quanta jovialidade aparente escondia virtudes sérias e difíceis! Devemos ter cuidado com os homens de consciência. “